quarta-feira, 29 de março de 2017

VASCO 2017: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1984 FINAL CARIOCA

                                                                                     “Fora Calçada”
                                                                             Pichação em São Januário

1984                       Final Carioca

Depois de uma péssima campanha no campeonato carioca de 1983, os dirigentes vascaínos pressionados pela torcida resolvem fazer uma série de contratações e montar uma equipe forte.  Foi o que aconteceu: o time chegou as finais do brasileiro de 1984 disputando o título com o Fluminense.
            Era uma final inédita desde que o campeonato brasileiro começou a ser disputado, entre dois clubes da mesma cidade. A expectativa geral de grandes públicos nas finais e recordes de arrecadação de renda. Nas semifinais os dois clubes cariocas já tinham demonstrado a força de suas galeras com o Maracanã lotado apenas com as torcidas cariocas nos jogos entre Vasco e Grêmio e entre Fluminense e Corinthians.
            Nas finais foram dois jogos com mais de 100 mil pessoas que travaram uma disputa acalorada no estádio. De um lado o tricolor e o já tradicional canto; “A benção João de Deus”, de outro, a torcida vascaína contando suas músicas a plenos pulmões e o mesmo entusiasmo. Na última partida o duelo das torcidas foi interrompido para a união em torno do grito das “Diretas Já”. No período em que o país foi tomado por imensas multidões que se reuniam nas ruas pedindo a volta das eleições diretas para presidente através da Emenda Constitucional, em pleno estádio do Maracanã as duas torcidas cantavam “um,dois, três, quatro, cinco mil, queremos eleger o presidente do Brasil”. Era uma manifestação espontânea que surpreendeu a todos, inclusive aqueles que achavam que o futebol só servia para alienar as pessoas.
            Como sempre acontecia nos jogos decisivos, os jornais reservavam um espaço para explicar o que era uma torcida organizada e como aquela festa toda era montada, sempre destacando o esforço e o sacrifício dos torcedores: “eles chegam ao Estádio com horas de antecedência, viajam com seus times para qualquer lugar, gritam, xingam, aplaudem, reclamam dos juízes, e as vezes, ainda brigam. Eles se agrupam nas chamadas Torcidas Organizadas e fazem de tudo para ver seu time deixar o campo com a vitórias. Ontem, no Maracanã, estavam presentes dezenas de Torcidas Organizadas: Vasquita, Motivascão, Vasbicão, Influente, Young Flu, Fiel Tricolor, Dragões Tricolores, enfim muitas facções do Vasco e Fluminense”. Outra reportagem registra o uso de fumaças pelos vascaínos pela primeira vez: “Uma novidade paulista chega ao Rio, para o primeiro jogo da decisão do Campeonato Brasileiro entre Vasco e Fluminense. As Torcidas do Vasco, seguindo o exemplo do Palmeiras e Corinthians, encomendaram 50 tubos de fumaça colorida e garantem que farão um espetáculo maravilhoso, na entrada de seu time em campo. Um dos Diretores da Força Jovem (considerada a mais fanática do Clube), José Alberto Pereira, o Beto Metralha, disse que a fumaça tem as cores vermelha, preta e branca e vai saudar o time”.
            Neste período o futebol italiano campeão do mundo em 1982, dominava o futebol internacional, contratando os melhores jogadores do mundo para atuarem em seu país. Com o Brasil o assédio dos italianos não foi diferente. Praticamente 30% dos jogadores da seleção brasileira de 1982 atuavam na Itália e as investidas prosseguiam. Falcão, Sócrates, Zico, Edinho, Cerezzo, Júnior, Pedrinho, Dirceu já estavam lá.
            A intensa mercantilização do futebol foi se consolidando e eram cada vez mais visíveis as mudanças que se faziam na “economia da bola”. As camisas passavam a contar com as propagandas desde 1983, o assédio de clubes europeus se intensificava, inclusive sobre jovens promessas, como Geovani, Mauricinho, Bebeto, Branco etc.
            O presidente Calçada foi alvo de inúmeros protestos em função da venda de vários jogadores para o exterior neste período. O problema se estendia para os outros clubes, a relação entre dirigentes e torcedores eram constantemente estremecidas a partir deste período com inúmeras acusações de transações feitas de forma escusa e de enriquecimento dos dirigentes.
            O medo da torcida tinha uma razão clara o Vasco com vice-campeão brasileiro e com vários jogadores na seleção era um dos alvos preferidos dos clubes estrangeiros. Em junho o técnico interino da seleção Edu Coimbra, então técnico do Vasco, convoca a seleção para os três únicos jogos do Brasil. Roberto, artilheiro do campeonato brasileiro fazia sua ultima apresentação pelo Brasil.
            Entre julho e setembro de 1984, as relações da diretoria do Vasco (especialmente o presidente Calçada) e as torcidas organizadas do clube estiveram bastante tensas. A dificuldade na renovação de contrato com Roberto e as derrotas provocaram uma onde de protestos que estremeceram o bom ambiente do início do ano. Eis algumas manchetes dos jornais: TORCIDA DO VASCO NÃO IRÁ VER JOGO EM CAMPOS, CLUBE SE VINGA E BARRA OS TORCEDORES NA PORTA, GRANDE MANIFESTAÇÃO EM SÃO JANUÁRIO, TORCIDA AMEAÇA QUEBRAR O VASCO.Numa das manifestações o grupo levou cartazes que diziam: Presidente Mercenário, Fora Diretoria Incompetente, Calçada Na Rua, Já e Aqui Jaz Calçada”.
            Não só o dirigente foi o alvo das críticas, um manifesto é escrito e entregue a imprensa prometendo o boicote dos torcedores aos jogos do Vasco em Campos e Volta Redonda. Entre os assinantes do documento estavam: Dulce Rosalina da Renovascão, João Teixeira da Vasbicão, Amâncio César da TOV, Ely Mendes da Força Jovem, Ivan da Motivascão e Geraldo da Furacão da Colina”.
            O presidente parte para o ataque e acusa os torcedores de receberem dinheiro do clube para as viagens e de não serem sócios e daí não terem legitimidade para fazer as críticas: ““Alguns torcedores que assinaram o manifesto, nem sócios do Vasco são. Então, com que direito acham que podem dar palpites nas decisões dos dirigentes? Alguns dos que estão liderando o boicote ao time, anunciando que não irão a Campos, volta e meia organizam caravanas com o auxílio do Clube, que financia parte do aluguel dos ônibus para as viagens”, conclui o dirigente.
            Do lado dos torcedores havia reações mais pacíficas e outras mais agressivas. Alguns sugeriam pichar os muros, outros diziam que deveria haver quebra-quebra e ameaçaram jogar ovos no presidente na hora que ele fosse entrar no clube. Um torcedor resumiu a situação: “estamos cansados de tudo isto. Chegou a hora de mudar, O Vasco não é um estabelecimento para vender seus jogadores”.
            Em setembro o alvo é a federação carioca de futebol que não aceitou os pedidos do presidente da ASTORJ, Wilson Amorin, para a redução do preço dos ingressos: “o Conselho Arbitral da Federação decidiu por 8 votos a 2, manter os novos preços de ingressos de arquibancada e geral”. Os torcedores, revoltados prometeram abandonar as arquibancadas em todos os estádios e ocuparem apenas as gerais. Ely Mendes (FJV), prometeu liderar sua torcida para realizar a manifestação.
            A última grande manifestação da torcida foi promover um protesto diferente fazendo um silêncio total como se não tivessem torcedores no estádio. Além disso, não levaram bandeiras ou faixas.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.

 
Vasco Jornal do Brasil 1984

Vasco Jornal Última Hora 1984












domingo, 26 de março de 2017

VASCO 2017: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1983 PORCO COM BACALHAU

                                 “Domingo, eu vou ao Maracanã, vou torcer pro time que sou fã”
                                              Canto preferido de todas as torcidas nas arquibancadas
1983                       Porco com Bacalhau

Disputado no primeiro semestre de 1983, o campeonato brasileiro consolidava a aliança que se tornaria histórica entre as torcidas de Vasco e Palmeiras. Mesmo com dois jogos entre os dois clubes em abril, a tônica dominante entre as torcidas era assegurar os laços de união e confraternização. Na ocasião dos jogos foram feitos churrascos para os paulistas organizados pelos cariocas na partida no Rio de Janeiro e recepção calorosa aos vascaínos em São Paulo. No mesmo campeonato a aliança seria testada no confronto entre Vasco e Corinthians no Morumbi.
            Vale lembrar que neste ano (em janeiro) era fundada a Mancha Verde do Palmeiras, que se tornou a principal torcida desde então. Esta torcida uniformizada surgiu em função da união de outras torcidas do clube. A Mancha Verde, conforme veremos nos próximos capítulos, revolucionou o conceito de torcida. No âmbito interno do clube, seu objetivo era criar um movimento nas arquibancadas a altura da tradição do Palmeiras.
Neste ano acontece uma grande confusão envolvendo as torcidas de Vasco e Corinthians em São Paulo. Não faltaram críticas dos cariocas com relação ao comportamento dos policiais paulistas que se omitiram diante das agressões. A Diretoria do Vasco ficou de tomar providências junto a CBF e a Federação Paulista no sentido de apurar responsabilidades. A imprensa carioca registrou o sufoco na volta para o Rio de Janeiro: “a viagem prevista para oito horas no máximo, durou cerca de 13 horas, em conseqüência das agressões dos torcedores paulistas, inconformados com o resultado do jogo. Vários ônibus dos torcedores cariocas foram apedrejados na saída do Morumbi, alguns deles tiveram os vidros estilhaçados e torcedores atingidos por pedras e paus, conforme denúncia dos Líderes de Torcida. E as provocações e agressões continuam até a saída da capital paulista, já no acesso a Via Dutra”[1].
            Poucos dias depois o Jornal O Globo, que nos próximos anos faria intensa campanha contra as torcidas organizadas, dá voz aos vascaínos que prometem vingança no jogo de volta do Corinthians no Rio: “ainda revoltados com as agressões sofridas no Morumbi, após o jogo contra o Corinthians, alguns líderes de Torcidas Organizadas do Vasco compareceram ontem a noite a São Januário para comunicar aos dirigentes que agirão da mesma maneira em relação aos torcedores paulistas, quando o Corinthians vier enfrentar o Vasco no Maracanã no fim do mês”. Prossegue a reportagem com a anunciada revanche prometida pelos cariocas: “já estamos cansados de sofrer todo o tipo de agressão fora do Rio e tratar com gentilezas os torcedores dos outros Estados no Maracanã. Agora vamos dar o troco, especialmente nos corinthianos, que nos atacaram com paus e pedras no Morumbi”, prometeu Ely Mendes, Chefe da Força Jovem[2].
Demonstrando que a sua linha editorial ainda era de apoio aos torcedores organizados, a imprensa continuava noticiando as viagens dos torcedores para acompanhar o time. O sacrifício dos torcedores que viajaram 26 horas para a Bahia era o destaque do jornal para contar a dedicação e amor ao clube das torcidas organizadas. Na reportagem predomina a visão romântica dos torcedores empenhados em levar o nome do clube aos mais distantes estádios do Brasil.
As iniciativas de pacificação entre as torcidas ainda ganhavam eco entre os líderes, bem como a solicitação de medidas punitivas para os agressores e os clubes eram reivindicadas pelas lideranças. Eram soluções viáveis naqueles anos que os órgãos responsáveis não souberam levar adiante. O título da reportagem ilustra a situação vivida: TORCEDORES DO VASCO CONDENAM A VIOLÊNCIA. E GARATEM A SEGURANÇA DOS CORINTHIANOS. “Se depender das Torcidas Organizadas do Vasco a paz está decretada na guerra que vem repetindo a cada rodada da Taça Ouro, em jogos de equipes de Estados diferentes. Ontem, grande parte das 42 facções do Vasco, esteve em São Januário e houve a garantia que os torcedores corinthianos que vierem ao Rio amanhã poderão torcer e retornar em paz para São Paulo”[3].
Algumas medidas simples foram tomada pelo poder público para melhorar as condições dos estádios. Ao assumir o governo do Estado do Rio de Janeiro, o governador Leonel Brizola nomeou para a presidência da SUDERJ Jorge Roberto da Silveira. Entre as primeiras medidas do novo secretario estava a reforma da Geral do Maracanã, com a elevação do piso em 50 cm.
            A geral era o local mais barato do estádio, em compensação tinha uma visão prejudicada já que ficava abaixo do piso do gramado. Em muitos locais era difícil enxergar a bola, somente a perna dos jogadores ficava ao alcance da visão.
            Esta obra foi a primeira intervenção de algum governo desde a criação do estádio em 1950. Embora a visão continuasse difícil em alguns pontos, a atuação do secretário foi elogiada pelos torcedores que consideravam o político um homem democrático e preocupado em estabelecer um diálogo com as torcidas. Em 1986 quando saiu do cargo para concorrer a deputado estadual, Jorge Roberto contou com o apoio da maior parte das lideranças das torcidas organizadas.
Depois de Sinatra em 1980, em junho deste ano o Maracanã foi palco de uma banda de rock pesado que muitos brasileiros desconheciam: o Kiss, com seu visual característico de máscaras e roupas pretas, levando mais de 100 mil pessoas ao estádio, antecipando a viabilidade comercial do Brasil ser também a rota comercial dos grandes shows de rock. Depois do Rock in Rio em 1985, Sting em 1987 e Tina Turner em 1988, também conseguiram levar multidões ao estádio Mario Filho.
Após vender Pedrinho e Elói para o futebol europeu, o Vasco via a ascensão do Fluminense com a dupla Assis e Washington (o casal 20) arrancarem para o tricampeonato (1983-84-85). E o público carioca passou a ouvir no lugar de “a benção João de Deus”, a música “Recordar é Viver, Assis acabou com você”. Logo esta canção seria incorporada por todas as outras quando um atleta virava o carrasco do rival.
Na TV, sem a transmissão direta dos jogos, restava ao torcedor acompanhar o compacto da TVE sempre as 20 horas (os jogos terminavam as 19h). Em seguida o debate e a mesa redonda comandada pelo locutor Januário Garcia, com o bordão “taí o que voce queria, bola rolando...”. Com a presença de Luiz Mendes, Sergio Noronha, Achilles Chirol, Washington Rodrigues e jogadores ou tecnicos convidados. Em seguida, as 22 horas mudar para os “Gols do Fantático”. No rádioesportivo este seria o último ano do locutor José Carlos Araújo, o Garotinho, comandar a Rádio Nacional. Ele passaria a ser o principal locutor da Radio Globo nos próximos anos e o mais ouvido da galera.
            Para o campeonato carioca de 1983 as esperanças estavam depositadas nas jovens estrelas do clube, principalmente Geovani que acabava de conquistar o campeonato mundial de juniores. O meia foi considerado o melhor jogador do torneio e grande esperança da torcida. A imprensa registrava a chegada doa jogadores ao Brasil e a recepção da torcida: “ a Força Jovem e Renovascão prestam homenagem aos jogadores, Geovani (Campeão do Mundial de Seleções Junior) e Ernani (Campeão do Torneio de Toullon pela Seleção Brasileira), com placas comemorativas. “A Torcida está satisfeita com o desempenho dos dois, além da oportunidade de ver os jogadores de seu time nas três Seleções Brasileiras, Junior, Novos e Principal.” disse Ely Mendes[4]. Apesar de tudo, o time decepciona e termina o campeonato em péssima posição. Para 1984, mudanças teriam que ser feitas...
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.


[1] Fonte: Jornal O Globo 15 de Março de 1983.
[2] Fonte: Jornal O Globo 16 de Março de 1983
[3] Fonte: Jornal Última Hora 30 de Março de 1983.
[4] Fonte: Jornal do Brasil 22 de Junho de 1983.

Vasco Jornal Última Hora 1983

Vasco Jornal do Vasco 1983


quarta-feira, 22 de março de 2017

VASCO 2017: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1982 TODOS PARA A GERAL

                 “Só porque Zico joga no Flamengo, eu vou torcer pelo Flamengo?
                                        Nada disso, eu sou é Vasco.”
                                tia do jogador do Flamengo, Dona Adélia

1982                       Todos para a Geral

Para fortalecer a ASTORJ e ganhar maior legitimidade entre as centenas de torcidas organizadas, as torcidas de cada clube passam a fundar as suas próprias entidades representativas e assumem o comando de representação das mesmas. Em abril ( dia 13) era fundada a ASTOVA (Associação das Torcidas Organizadas do Vasco da Gama), tendo como primeiro presidente Amâncio César.
            Foi um ano de muitas mobilizações e campanhas, começando com um protesto contra o aumento do preço dos ingressos em janeiro, muros pichados em São Januário em maio, boicote aos jogos com as torcidas organizadas assistindo as partidas na geral. Em julho foi a vez das faixas da torcida contra o técnico da seleção brasileira na volta da Copa da Espanha e a participação no II congresso das Torcidas Organizadas do Brasil em Porto Alegre.
            De todos os atos, o protesto mais marcante foi na primeira vez que o muro de São Januário seria pichado. Entretanto, não foi um ato que contou com adesão da ASTOVA. Entre as frases no muro se destacavam “Fora Calçada” e “Queremos Time”. Os líderes vascaínos defendiam um boicote pacífico prometendo não levar para o jogo faixas, bandeiras e baterias, pois achavam que a maioria dos jogadores não estava se empenhando como deveriam.
            Por outro lado, a Copa do Mundo da Espanha gerava uma forte expectativa no país. O entusiasmo com a seleção brasileira em 1982 tinha por base a forte identificação dos torcedores com os jogadores e o estilo de jogo ofensivo e criativo. Dos 22 convocados, apenas Dirceu e Falcão não atuavam no Brasil.
            A animação chegou as ruas pouco antes da Copa do Mundo começar em junho. Milhares de pessoas juntaram-se aos amigos e vizinhos e através de uma rede de solidariedade espontânea começaram a enfeitar as ruas de todas as maneiras, como foi em 1978. A diferença foi nas proporções, na copa da Argentina também se coloriram as ruas, mas nada comparável com o que aconteceu em 1982. A medida de a competição se aproximava, novas maneiras de embelezar o espaço público brotavam. O espírito carnavalesco fazia parte do cenário das ruas que viviam cheias de grupos pintando uma parte, desenhando nos muros, fazendo as fitas das rabiolas, bebendo e preparando um churrasco. Enfim, tudo em consonância para fazer o que as torcidas já faziam nos estádios.
            Para assistir a Copa era impossível em outro canal, a não ser a Rede Globo que comprou os direitos exclusivos, fez uma intensa cobertura dos jogos e deu grande espaço para a mobilização dos torcedores. Também na mesma emissora ganhava destaque o personagem “Zé da Galera”, interpretado pelo comediante Jô Soares, que encarnava um torcedor falando sempre com o técnico da seleção por um telefone público (orelhão). Ficou famoso o bordão: “Bota ponta, Telê!”. Na propaganda a figura do torcedor Pacheco, pela Gillete, também caía no gosto dos torcedores, se popularizando entre a galera. Quem fez muito sucesso em 1982 foi a banda iniciante Blitz, apresentando a vocalista vascaína Fernanda Abreu com apenas 21 anos, cantando a música de maior sucesso do ano: “Você não soube me amar”.
            Para os vascaínos a derrota da seleção teve uma forte dose de frustração como para toda a torcida brasileira, mas uma decepção e um toque de revolta pessoal contra o técnico Telê Santana e a insistência de não ter dado nenhuma chance a Roberto que vivia uma ótima fase, enquanto o titular, Serginho, do São Paulo, tinha atuações irregulares.
            No contexto de empolgação com a Copa de 1982, surge um novo programa televisivo em que os protagonistas são os torcedores: entra no ar “A Bronca é Livre”, apresentado por Denis Miranda, pela TV Bandeirantes, no mesmo formato de “Conversa de Arquibancada”, entretanto, o programa não fica muito tempo no ar. Na mesma época, pela Rádio Nacional, o radialista José Cabral, dedicava as segundas-feiras na hora do almoço, entre 12 e 13h, um debate com os chefes de torcidas convidados.
            Mas não só de protestos viveu o ano de 1982, nas arquibancadas ganhava cada vez mais impacto o desfile das bandeiras faltando meia hora para o jogo começar. Os torcedores saiam pelos tuneis de entrada das torcidas no meio de campo (espaço neutro) e percorriam toda a arquibancada desfraldando suas bandeiras, sendo acompanhado por aplausos e gritos de guerra em todo o estádio.
            Outro comportamento que surgia nesta época, era a torcida gritar o nome de cada jogador de seu clube a medida que o placar eletrônico mostra a escalação do time. Dependendo da fase cada jogador tinha seu nome gritado com mais ênfase. Na época, geralmente, Roberto era o nome com maior destaque.
            A festa em novembro veio com a comemoração do gol 500 de Roberto Dinamite em São Januário. O jogador que vivia uma ótima fase se consagraria com a conquista do título carioca no final do ano, depois das eleições no clube que teve como candidatos Antonio Soares Calçada, Eurico Miranda e Agathyrno Gomes (que contou com o apoio da Força Jovem). O resultado final deu a vitória a Calçada. Derrotado, Eurico ficou reclamando do esquema viciado das eleições...
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.

Vasco Maracanã 1982

Vasco Jornal O Globo 1982




domingo, 19 de março de 2017

VASCO 2017: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1981 DO PIQUETE AO PIQUET

                “Perigo: não fumem. Dinamite em campo”                                                                                               Concurso de frases promovido pelas Torcidas do Vasco
      
1981                       Do piquete ao Piquet
O nome de Lamartine Babo estará sempre ligado ao futebol de todos os clubes cariocas. Embora o compositor fosse fervoroso torcedor do America, ele foi o responsável, em 1944, por fazer o hino não oficial de todos os 12 times cariocas da época. Em homenagem a esta grande figura da música popular, a escola de samba Imperatriz Leopoldinense, apresentou como enredo principal a obra do compositor de memoráveis músicas e marchinhas. Com o samba-enredo "O Teu Cabelo Não Nega - Só Dá Lalá", centenas de torcedores desfilaram pela escola.
            Um passo importante na reivindicação dos torcedores veio em maio com a criação da ASTORJ (Associação das Torcidas Organizadas do Rio de Janeiro). Entre as principais metas da nova entidade estava o controle do preço dos ingressos. Com a inflação galopante desde 1979, os torcedores estavam preocupados com o aumento excessivo dos valor dos ingressos, acima dos índices da inflação. A atuação da ASTORJ expressava o sentimento geral  de que o espetáculo esportivo não poderia ser decidido apenas entre os dirigentes dos clubes e da federação carioca de futebol.
            Um dos frutos da criação da ASTORJ foi a greve geral promovida pelas torcidas em junho, nas reivindicações outros assuntos entravam na pauta de lutas: as fraudes e denúncias de corrupção em diversas partidas de futebol. Neste período a imprensa deu voz aos torcedores e fez inúmeras reportagens que confirmavam as denúncias. É inegável que, neste período, a ASTORJ, assume um compromisso de ser uma organização popular voltada para transformar o futebol e combater o elitismo dos dirigentes esportivos.  A reportagem esclarece o objetivo da 1ª reunião: “A Associação das Torcidas Organizadas (ASTORJ) vai realizar sexta feira sua primeira reunião, na Sede da FUGAP e na segunda sua Diretoria irá a reunião do Conselho Arbitral, na Federação, para exigir a redução dos preços dos ingressos no Maracanã e outros Estádios. A Chefe da Renovascão, Dulce Rosalina, Relações Públicas da Associação, disse que os torcedores promoverão um boicote total aos jogos se não for atendido seu pedido”.
            Alguns meses depois algumas divergências internas começam a aparecer e os líderes não conseguem unificar o seu discurso e a sua prática: “como consequência das denúncias sobre corrupção no futebol, a ASTORJ (Associação das Torcidas Organizadas do Rio de Janeiro), resolveu protestar nas partidas deste fim de semana, colocando suas faixas nos Estádios pelo avesso. A finalidade é demonstrar o repúdio do torcedor aos fatos denunciados e exigir a apuração rigorosa do caso, segundo um dos membros da Diretoria, Ely Mendes da Força Jovem. A manifestação com as faixas não conta com o apoio da Vice Presidente da Associação e Chefe da Renovascão, Dulce Rosalina, que  considera não haver motivo para desprestigiar clubes e jogadores não envolvidos em denúncias e promete colocar suas faixas no Maracanã normalmente amanhã”.
            Não era só acompanhando o futebol que os vascaínos vibravam no ano de 1981. As alegrias começava pelas manhãs dos domingos acompanhando as vitórias do piloto de Fórmula 1, Nelson Piquet, um vascaíno convicto. Em diversas reportagens o ídolo fazia questão de ressaltar o amor ao clube de seu coração. Por exemplo, em entrevista a Revista Placar em maio, Nélson comemorava a vitória na corrida em  San Marino dizendo que sua alegria só não era completa porque o Vasco havia sido eliminado do Campeonato Brasileiro. Dulce Rosalina ouviu esta entrevista na rádio e logo providenciou o envio de uma camisa do Vasco ao piloto. Piquet gostou, vestiu-a e desfilou com ela nos boxes do GP da Bélgica. A festa vascaína com seu idolo das pistas ficou completa com o seu primeiro título mundial em 1981.
            Indiscutivelmente as maiores emoções do ano ficaram reservadas para as últimas partidas de 1981 quando o clube disputou uma série de três partidas finais contra o Flamengo. O clube rival tinha uma  grande vantagem pois precisava de um simples  empate nas duas primeiras partidas para ficar com o título. No primeiro jogo a maioria da torcida no Maracanã ficou do lado adversário. Entretanto, os dois gols de Roberto fizeram a festa da torcida vascaína calar os rubro-negros.
            Para a segunda partida, os vascaínos prometiam dividir as arquibancadas: “ontem, grande movimentação por parte dos Chefes das Facções da Torcida Vascaína e todos obviamente animados com o sucesso do time. Mas no domingo, a tarefa de torcer não foi das mais fáceis. Ely, Chefe da Força Jovem, contou um lance pitoresco. “Conseguimos 5 mil bolas de aniversário para soltar no Maracanã. Chegamos lá as 11 horas e ficamos até as 15 horas enchendo. Trinta caras para encher tantas bolas, acabou não dando tempo. Ficamos cansados, enchemos apenas 1 mil 500 e mesmo assim fomos mais entusiasmados do que o Flamengo. Para amanhã, papéis picados e as bolas já estão providenciados”[1].
            O segundo jogo teve novamente a vitória do Vasco, dessa vez com um sabor especial com um gol de Roberto nos minutos finais quando os flamenguistas já comemoravam o título. A empolgação dos vascaínos com o momento era nítida e não faltaram provocações: “muitos torcedores lamentaram ontem em São Januário o fato de o Presidente da Federação Otávio Pinto Guimarães, não ter permitido que os ingressos do jogo fossem impressos com as cores dos Clubes . Iriam segundo eles, provar que a Torcida do Vasco é a maior do país”[2].
            A cidade do Rio de Janeiro parou para acompanhar a terceira e última partida da decisão. De um lado estavam os vascaínos, entusiasmados com o crescimento do poder de reação de seu time na reta final. Do outro lado, estavam os rubro-negros preocupados com um terceiro fracasso e a repercussão que isto poderia trazer para o time que disputaria a final do mundial interclubes no Japão, na semana seguinte. A verdade é que o título foi decidido dentro e fora do gramado. Em campo o Flamengo iniciou bem a partida e fez logo dois gols. No segundo tempo, o time do Vasco se reencontrou e reagiu pressionando até marcar o gol nos 10 minutos finais. A partir daí “a torcida rubro-negra que cantava “vou festejar”, sucesso na voz de Beth Carvalho, emudeceu. Animado, o time de São Januário passou a pressionar, quando surgiu em pleno gramado um personagem que passou a fazer parte do folclore do futebol carioca: Roberto Ladrilheiro” (Assaf e Martins, 1999, p.70).
            Até hoje a história da invasão do torcedor da geral não foi bem explicada. E a versão que ficou foi a oficial. O que de fato aconteceu foi uma vergonha e mostrou que os rubro-negros haviam se preparado para ganhar aquele jogo de todas as maneiras. Muitas pessoas afirmam que o Ladrilheiro não saiu da geral e sim do banco de reservas do Flamengo.
            Em seu depoimento para o livro de Hilton Mattos, Heróis do Cimento, o torcedor diz que o técnico Paulo Cesar Carpegiani lhe deu sinal verde para ele entrar, dizendo “vai, vai”. Como um técnico falaria para um desconhecido para entrar em campo e tumultuar o jogo? O Ladrilheiro “atendeu o  pedido do treinador. Cruzou o campo como uma flecha, atrapalhou a cobrança de falta de Dinamite (...) lá do alto a torcida do Flamengo gritava histérica, saudando seu representante invasor” (Mattos, 2007, p.89). E assim se passaram alguns minutos que esfriaram a reação vascaína.
            Nenhum cruzmaltino engoliu aquele título naquelas circunstâncias e o silêncio da imprensa apenas confirmava como esta estava comprometida em assegurar “o resultado do time inesquecível”. A resposta do Almirante veio ao longo de toda a década com inúmeras vantagens para a nossa agremiação.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.


[1] Fonte: Jornal do Brasil 01 de dezembro de 1981.
[2] Fonte: Jornal o Globo 02 de Dezembro de 1981

Vasco Jornal O Globo 1981

Vasco Revista Placar 1981

sábado, 11 de março de 2017

VASCO 2017: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1980 DINAMITE ENTRE O PAPA E SINATRA

                                                    “Não tememos esse ridículo combinado de Torcidas”
                                                                          Amâncio César, TOV

1980                Dinamite entre o Papa e Sinatra

Criada no final do ano de 1979, a CBF tinha como desafio maior dar um novo rumo para o futebol brasileiro e iniciar um processo de modernização deste esporte. O primeiro passo foi a criação do técnico exclusivo: Telê Santana deixava o Palmeiras e passava a dar toda atenção ao selecionado brasileiro.
No Vasco a principal mudança era a contratação de Jorge Mendonça para cobrir a saída do ídolo Roberto Dinamite vendido para o futebol espanhol. Os dois eram craques e brilharam na Copa de 1978, mas eram jogadores de estilos bem diferentes (Roberto era centroavante e Mendonça era meia esquerda), contudo para Dulce Rosalina valia o ditado “rei morto, rei posto”, para ela o ex-atacante do Palmeiras, seria o jogador perfeito para dar um toque refinado ao time e ser o principal elo de ligação com o centroavante Paulinho. Não seria uma tarefa tão simples como os dirigentes e a torcedora-símbolo apostavam, mas a rivalidade com o Flamengo reaproximaria Roberto ao Vasco em questão de poucos meses.
Antes da visita do papa ao Maracanã, o nome mais ouvido pelos gritos da galera era Roberto Dinamite, após três meses em Barcelona e insatisfeito com o novo clube, o ídolo foi sondado por dirigentes de Flamengo que negociavam sua volta para o Brasil e formar uma dupla de ataque com Zico.
Marcio Braga, principal dirigente rubro-negro, antecipava pelos jornais a contratação do atacante e provocava a torcida vascaína. Neste momento dirigentes vascaínos passam a negociar também. A disputa entre os diretores dos clubes rivais acirrava o debate entre os torcedores que aguardavam com imensa expectativa o desfecho daquele confronto.
Para  o Vasco virou uma questão de honra não deixar o rival colocar a sua camisa rubro-negra no principal ídolo cruzmaltino dos anos 1970. E foi o que aconteceu: Roberto volta ao Brasil com uma recepção calorosa no aeroporto feita pelas torcidas.
A resposta do Flamengo viria a seguir com a partida entre Vasco e Corinthians no Rio de Janeiro. Na semana da estreia de Roberto no Maracanã a polêmica foi apimentada por Marcio Braga que, desmoralizado com sua torcida, tenta dar a volta por cima resolvendo acirrar os ânimos entre cariocas e paulistas, ao promover a união das torcidas de Flamengo e Corinthians contra o Vasco.
Sua estratégia de marketing era criar a “Fla-Fiel”, uma alusão a junção da torcida do Flamengo com a maior torcida organizada do Corinthians, a Gaviões da Fiel. O objetivo era incentivar uma nova invasão corintiana como foi feita em 1976. Mas o golpe completo foi marcar rodada dupla (o Vasco foi contra) com a preliminar entre Flamengo e Bangu, também pelo campeonato brasileiro (mas em outra chave). A partida principal ficaria entre Vasco e Corinthians.
O resultado final deixou qualquer vascaíno em êxtase e até hoje faz questão de lembrar: goleada por 5 a 2, com 5 gols de Dinamite. Marcio Braga e a torcida do Flamengo querem esquecer para sempre aquele dia...
Em 1980 o Maracanã deixou em duas ocasiões de ser o palco principal do futebol para receber duas atrações extra-esportivas. A primeira foi em janeiro com o cantor norte-americano Frank Sinatra que visitava o país pela primeira vez. Ele conseguiu levar mais de 100 mil pessoas ao estádio que conheceu, neste dia, um dos personagens mais folclóricos da década, mais conhecido como o Beijoqueiro.
Se Sinatra fez sucesso no Maracanã, poucos meses depois ele seria suplantado por uma figura religiosa de grande popularidade: a visita do Papa João Paulo II ao Brasil. Aquela seria a sua primeira vez no país e, sem dúvidas, a mais importante. Percorrendo varias cidades, o papa conseguiu arrebanhar milhares de pessoas pelos estádios por onde passou, sem contar com a transmissão ao vivo pela TV em alguns locais.
Na ocasião uma música[1] marcaria o contato do sumo pontífice com as multidões. A canção em sua homenagem “A benção João de Deus” era cantada em todos os cantos do país, tornando-se um ícone no imaginário popular da época. Logo a música seria  incorporada pelas torcidas de seus clubes nos estádios. Em principio ela não tinha identificação com nenhum clube específico.
Antes da visita do Papa ao Brasil o Flamengo conquistaria seu primeiro campeonato brasileiro. Para fazer frente a Flapress que vivia endeusando o clube da Gávea, o Vasco fazia uma nova grande contratação. Trazia do Grêmio o tricampeão mundial, Paulo César Caju. O atacante que já havia jogado pelo Botafogo, Flamengo e Fluminense, agora seria a nova estrela vascaína. Empolgada com a contratação, a torcida da cruz de malta foi maioria absoluta nos mais de 60.000 pagantes[2] que prestigiavam a estréia do craque no primeiro jogo da Taça Guanabara de 1980.
Mas não era somente PC que a torcida queria ver, tinha também um elenco feminino especial que entraria em campo: as “foguetes”. Uma novidade lançada pelo apresentador de TV Carlos Imperial. As “lebres do Imperial” entraram em campo com uma bandeira gigante do Botafogo e distribuindo flores. Foram recebidas calorosamente pela torcida vascaína aos gritos de “Piranhas, piranhas”.
Mas a gozação maior veio no final do ano com a derrota do Flamengo para o Serrano com o gol de Anapolina. Com este resultado, o rubro-negro viu o Vasco assumir a liderança do campeonato e depender só dele para conquistar o título. O que acabou acontecendo na semana seguinte com a vitória sobre o Americano em São Januário. O troféu do segundo turno foi comemorado intensamente pelos vascaínos que lotaram o seu estádio (mais de 20.000 pessoas) e viram seu clube fazer o gol da vitória no último minuto. Ao final da partida uma multidão invadiu o gramado para comemorar com os jogadores e fazer um verdadeiro carnaval em campo. Foi uma das partidas mais emocionantes de todos os tempos no nosso glorioso estádio[3].
A festa dos vascaínos ficaria completa no fim do ano com a conquista do campeonato carioca pois quebraríamos a “escrita” diante do Fluminense. No entanto, o time não estava inspirado e o tricolor venceu o Vasco por 1 a 0, gol de falta de Edinho[4]. Pouco antes da cobrança, na tensão do empate, os tricolores resolveram entoar a “canção do Papa”. Daí em diante ficou para sempre na lembrança dos tricolores. Era a senha para os tricolores incorporarem em definitivo a canção como uma graça divina alcançada. Virou o “hino da torcida tricolor”.

[1] Nas rádios de todo o Brasil, o “Balancê”, era a música de maior sucesso na voz da cantora baiana Gal Costa. A sua letra seria adaptada pela torcida do Vasco em 1992 para gozar com os rubro-negros, na tragédia do Maracanã naquele ano.
[2] Apesar do aumento expressivo no preço das arquibancadas que passou de Cr$ 80,00 para Cr$ 120,00, o que provocou uma reação da torcida. Dulce Rosalina chegou a sugerir uma greve dos torcedores como protesto pela majoração dos ingressos.
[3]  O locutor esportivo da TV e colunista do Jornal dos Sports, Carlos Lima,  comentou: “Em quase 30 anos de carreira, com muitas Copas, Olimpíadas, pentacampeonato do meu Esporte Clube Bahia, nunca vi o que Vasco e Americano proporcionaram na quarta passada: vi gente desfalecendo e vi gente chorando"
[4]  No duelo das torcidas no estádio, o Jornal do Brasil do dia seguinte fez a seguinte comparação: “Visualmente na entrada dos times em campo, a torcida do Vasco levou vantagem: as bandeiras, papéis brancos e foguetes fizeram maior efeito do que o talco e foguetório dos tricolores. Em entusiasmo, no entanto, perdeu nitidamente para o Fluminense, principalmente depois do gol”.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.

Vasco 1980

Vasco Jornal do Vasco 1980



quarta-feira, 8 de março de 2017

VASCO 2017: LIVRO "100 ANOS DA TORCIDA VASCAÍNA", 1979 CONVERSA DE ARQUIBANCADA

         “Casaca, casaca, casaca, a turma é boa, é mesmo da fuzarca, Vasco, Vasco...”
                                                         Principal Grito de Guerra da Torcida

1979               Conversa de Arquibancada
No início de 1979 as atenções da torcida estavam voltadas para a nova comissão técnica que acabava de assumir. Nela estavam o técnico Carlos Froner e o preparador físico Antonio Lopes, que nos anos 1980 se tornaria um técnico consagrado.
Enquanto o futebol se preparava para o campeonato carioca no primeiro semestre e o brasileiro no segundo semestre, o destaque foi a conquista do campeonato carioca de basquetebol. Milhares de torcedores compareceram ao Maracanãzinho para ver o Vasco conquistar mais um título.
Nas arquibancadas começavam aparecer notícias de uma nova torcida organizada, a Torcida Almirante da Colina (TAC), liderada por Chiquinho. Em março um desentendimento entre integrantes da TOV e da TAC provocou uma briga com acusações de ambos os lados. Tudo começou com a venda de ingressos para a caravana a Volta Redonda: “ao chegar ontem para iniciar mais um dia de vendas, integrantes da TOV encontraram o cadeado de sua barraca soldado e assim não puderam atender diversos torcedores que invariavelmente, eram encaminhados ao stand da Almirante da Colina” .
Rivais e aliadas, dependendo da situação, as torcidas do Vasco seguindo o exemplo das escolas de samba promoveram uma competição interna para ver qual era a melhor torcida de acordo com  3 critérios: A) Animação (incentivo ao time), B) Contingente e número de bandeiras e C) Recepção a entrada do Time em campo.
Mas a briga maior neste ano foi contra a diretoria que realizou a venda de inúmeros jogadores, dentre eles o zagueiro Abel, um dos maiores ídolos naquela década. Com sua garra característica, o defensor logo conquistou a simpatia dos torcedores.
Como era um ano de eleição no clube logo os protestos ganharam conotação política: “Não vendam nossos craques”, “Modificação total no Vasco”, “Estamos com Calçada, Sendas e Olavo” e outras faixas e gritos eram lidas e ouvidas em todas as facções das Torcidas do Vasco” . Quanto mais a torcida via o sucesso de seu maior rival, mais a situação do presidente Agathyrno se complicava. Estava chegando ao fim a ERA AGATHYRNO (1969-1979) que contou com o apoio das torcidas organizadas na maior parte de sua gestão, com exceção de Dulce Rosalina que já fazia oposição há mais tempo.
Se faltavam motivos para gabar-se do presente a solução era comprar a revista especial de Placar em homenagem ao clube e sua história. Entre as inúmeras reportagens uma delas nos enchia de orgulho, com o título: “A HORA DO NEGRO NO CLUBE DO POVO”. Numa época de pouca circulação de informações aquela revista era um material permanente de consulta e leitura de um clube que tinha um passado para se orgulhar, ao contrário de seus adversários que tiveram origem elitista
Além de Placar, a revista Manchete Esportiva (com menor sucesso) também dedica neste ano uma matéria que envolve  a confraternização das torcidas cariocas posando juntas no gramado do Maracanã. Entre elas estavam: do Vasco (TOV, Força Jovem, Vaspanema), do Flamengo (Torcida Jovem do Flamengo, Raça Rubro Negra, Flamor, Flaponte), do América (Inferno Rubro), Fluminense (Fiel Tricolor, Young Flu) e do Botafogo (Torcida Jovem do Botafogo, Fogo Lito).
Ainda no Maracanã, no mês de dezembro para mais de 100 mil pessoas elas voltavam ao gramado para exibirem suas bandeiras enquanto a garotada aguardava a chegada do Papai Noel: “as Torcidas de Vasco, Fluminense e Flamengo, com bandeiras enormes ocuparam o campo, fazendo evoluções. A Força Jovem (Vasco), A Torcida Fiel Tricolor (Fluminense) e a Torcida Jovem (Flamengo) fizeram um verdadeiro festival de bandeiras, sendo acompanhadas pelas torcidas nas arquibancadas”. Juntar as torcidas não era uma tarefa difícil naqueles anos, principalmente por causa de uma atração na TV. Surge uma inovação na programação televisiva carioca em 1979, através do programa “Conversa de Arquibancada”, pela Rede Bandeirantes (canal 7), apresentado por Hamilton Bastos. No cenário uma bancada com os principais líderes das maiores torcidas e uma pequena arquibancada, debatendo livremente e ao vivo os principais problemas do futebol e a preparação dos torcedores para as partidas da rodada. Sempre aos domingos às 14 horas, invariavelmente uma provocação aqui e uma gozação ali provocava uma pequena tensão e algumas discussões mais acaloradas.
A cada semana o público de casa ia se acostumando com aqueles novos líderes populares trazendo para a TV uma experiência inédita e aproximando os torcedores de seus pares mais assíduos das arquibancadas. Uma grande experiência democrática numa época marcada pela anistia e abertura política.
Foi neste programa que o intérprete Neguinho[1] da Beija-Flor, lança uma música que se tornaria a canção preferida de todas as torcidas cariocas com a letra: “Domingo, eu vou ao Maracanã/ vou torcer pro time que sou fã (...) não quero cadeira numerada/, vou torcer na arquibancada, pra sentir mais emoção...”. Logo a canção seria incorporada por todas as torcidas que adaptariam o canto com o grito de seu clube na hora de dizer: “ e o nome dele, são vocês que vão dizer: ô,ô,ô...Vascô”.
Foi também no  programa “Conversa de Arquibancada” que a torcida do Vasco entusiasmada com a vitória por 4 a 2 sobre o Flamengo, provoca o rival com uma canção em homenagem ao grande personagem do jogo. Um então desconhecido atacante vindo do Paraná: Catinha, que com uma atuação surpreendente e dribles desconcertantes, incendeia o estádio. Nas arquibancadas surgiu uma paródia da música de João Roberto Kelly: “Gatinha, que dança é essa que o povo fica todo bole?/Bole,bole,bole Gatinha”. Na versão da torcida vascaína, ficou assim: “Catinha que dança é essa que o Nelson fica todo mole?/Bole, bole, bole Catinha”. Nelson que era um zagueiro reserva do Flamengo, foi a maior vítima daquele jogo e se tornou a partir daí uma figura maldita no clube.
Era um período que ainda era possível de se ver a união e a confraternização entre as principais torcidas. As provocações paravam quando algo parecia fugir ao controle. Sempre que uma discussão ficava mais acirrada logo era apaziguada. Enfim os torcedores ganhavam um holofote que até então só os jogadores e dirigentes possuíam. Um sucesso jamais visto antes, inclusive de audiência. O que demonstrava o acerto da iniciativa do apresentador. Um programa que marcou época, mas que não se efetivou nos anos seguintes apesar de se ter tentado por outros momentos.
Se neste ano os canais de comunicação estavam abertos entre as principais torcidas cariocas, a rivalidade entre os estados se acirrava na classificação para as semifinais do campeonato brasileiro. Considerado um time imbatível pela Flapress, o rubro-negro era derrotado em pleno Maracanã para o Palmeiras, treinado por Telê Santana, que aplicou uma impiedosa goleada por 4 a 1, eliminando o carioca da competição. Nas arquibancadas a festa da torcida do Palmeiras irrita os rubro-negros que agridem covardemente os paulistas. Aquele conflito seria o maior tumulto entre as duas torcidas até então. Uma forte rivalidade que se estava formando para os próximos anos, junto com ela, uma aliança histórica com a torcida do Vasco. A mais forte aliança entre torcidas de estados diferentes.
Com o Internacional eliminando o Palmeiras e o Vasco derrotando o Coritiba, o final do ano de 1979 chegava com a possibilidade do clube de São Januário se redimir com a torcida e conquistar o campeonato brasileiro daquele ano. Mesmo sem ter um grande elenco, o técnico Oto Glória conseguiu levar o clube as finais contra o Internacional. A primeira partida seria no Maracanã e a final no Beira-Rio.
        Diante de 60 mil torcedores o Internacional não se intimidou e confirmou o favoritismo vencendo por 2 a 0. Era um publico muito aquém do que o Vasco poderia colocar, mas a torcida é sábia e não se entusiasmou pelo que viu em campo. Terminava o ano com uma decepção até esperada. No entanto, o pior estava por vir: a venda de seu maior ídolo para o Barcelona. Roberto se despedia do clube naquele fim de ano.
Fonte: Livro “100 anos da Torcida Vascaína”, escrito pelo historiador Jorge Medeiros.


[1] Em entrevista, o cantor relembra que a música tinha uma letra que homenageava somente o Vasco Eu peguei um ônibus na Praça Mauá pra ir até Nova Iguaçu, onde eu morava. Da Praça Mauá, no ônibus, eu fiz a música pro cara: 'Domingo, eu vou ao Maracanã, vou torcer pro Vasco que sou fã...'. Apesar de ser flamenguista. Aí uma hora eu estou vendo o samba... 'Domingo...' Eu conheço isso. Ih, é a minha música. Eu digo: Ó, vou tirar o Vasco e vou botar o time que sou fã, meu... E vou pegar aí todas as torcidas. Vou tirar esse Vasco aí da parada. (O GLOBO, 28/05/2013).

Vasco Jornal do Brasil 1979

Vasco Jornal do Brasil 1979